“EMILY”
Era uma vez uma rapariga. Esta rapariga não era como as outras meninas. Enquanto as outras brincavam com as suas bonecas e vestiam os seus vestidos cor-de-rosa e tomavam chá em chávenas vazias, Emily passara a sua infância escondida. Ouvia os pianos em vez das cantoras, punha batom nas bochechas em vez dos lábios, falava com os gatos e não com as outras meninas mas o que a mais separava de todas as outras meninas, é que Emily só tinha um nome. Emily. Nenhum apelido.
Agora, Emily encontrava-se nos seus vintes tardios e tinha uma profissão diferente das outras meninas. Enquanto elas eram cantoras e secretárias e governantas, Emily era escritora. O cabelo, castanho e caótico, pendia-lhe do crânio como um fado, para lhe tapar os óculos; o fumo proveniente das beatas, apagadas à pressa num cinzeiro carbonizado, transmitia um ambiente tenebroso ao seu quarto, apenas para ser quebrado pela madrugada.
Numa secretária à frente da janela, onde repousava a pena e o tinteiro, haviam sido escritos muitos contos no seu tempo. Os pianos da infância de Emily. Mas neste momento, a secretária era nada mais que um corpo cadavérico escrevinhado pelas gerações.
Emily levantou-se da sua cama, pousou a garrafa de Jack Daniels sobre o tampo da secretária e, dando uma baforada num Camel ou num Malboro, agarrou na pena e mergulhou-a no tinteiro. Começou a escrevinhar numa folha amarela e após ter lido e reflectido, risca o que acabara de escrever. Amarrotando o papel, atira-o contra o vidro e aos céus, na sua voz rouca, grita … um palavrão.
Emily era uma rapariga muito bonita.
Bebendo um pouco mais do seu elixir milagroso, observou o conjunto de folhas amarrotadas, papéis rasgados e pergaminhos sujos. Naqueles papéis, os versos narravam histórias de romance, de batalhas e pirataria.
Mas neste preciso momento, algo de inesperado está para acontecer. Os olhos de Emily divagam e assim começa – Uma ideia irrompe na sua cabeça: Quase que como num antigo relógio suíço posto a funcionar, as roldanas começam a rodar, os parafusos enterram-se na epiderme e os pêndulos começar a fazer aquilo que os pêndulos normalmente fazem. O movimento volta à sua pequena tola. As metáforas e hipérboles, já antigas, associam-se a novas ideias e começa a surgir um início. Umas frases feitas, uns estereótipos e clichés e ela tem meio. Agora só necessita de um fim e Emily, pela primeira vez, já sabe qual será:
“Era uma vez uma rapariga. Esta rapariga não era como as outras meninas. Enquanto as outras brincavam com as suas bonecas e vestiam os seus vestidos cor-de-rosa e tomavam chá em chávenas vazias, Emily passara a sua infância escondida. Ouvia os pianos em vez das cantoras, punha batom nas bochechas em vez dos lábios, falava com os gatos e não com as outras meninas mas o que a mais separava de todas as outras meninas, é que Emily só tinha um nome. Emily… “
João
. Emily