Sábado, 9 de Fevereiro de 2008

Cubículo "feio"

Como é que uma pessoa sabe o que realmente quer?

Quanto mais terei eu de sacrificar aos deuses para que me digam se vale a pena? Vale a pena?

E porque tenho eu de sacrificar aos deuses quando nem sequer acredito neles? Aliás, em que acredito eu? No Homem? Nos outros? Em mim? Não, não acredito em mim...

Desde pequeno que perdi a capacidade de acreditar. Desde pequeno que tudo corre mal: o meu cão morreu; as minhas tartarugas afogaram-se (estúpido, eu sei, mas foi o que aconteceu); os meus pais separaram-se... Mas isso tudo são coisas que acontecem na vida, nada demais, podem pensar. No entanto, o problema reside numa só razão: a culpa. Desde sempre (e não só desde pequeno) que me culpam de tudo: culpam-me de ter nascido (não sei como...); de ter estragado a bicicleta do meu irmão; de ter deixado o cão morrer quando foi ele que se atirou pela colina abaixo; de ter afogado as tartarugas, apesar de eu sempre ter opinado que elas, na verdade, não se afogaram, mas que se tinham engasgado com a enorme porção de comida que o meu irmão lhes deu (mas isso é simplesmente uma desculpa aos olhos dos meus pais, “como é que o teu perfeito irmão iria ser tão descuidado?”); também me culparam do divórcio dos meus pais, principalmente o meu irmão e a minha avó (a do lado do meu pai, a que ainda está viva, infelizmente), disseram e continuam a dizer, cada vez que nos encontramos, que não percebem como me aguentaram estes anos todos, que sou uma desgraça para a família, que foi por minha causa que os meus pais se separaram, já que não conseguiam lidar com o facto de terem juntos um filho tão “feio”.

Como podem reparar, quer por razões lógicas, quer por razões ilógicas, fui sempre ensinado a sentir-me culpado. Por  mais absurdo que seja o motivo, sou sempre o culpado. E, na realidade, acabo por sentir-me dessa forma, só com a pressão toda: parece ficar mal não me sentir culpado quando todos à minha volta me dizem que sou. Racionalmente, sei que não sou culpado, mas para quê remar contra uma maré que não tem fim? Faço de conta que me considero culpado e, assim, eles ficam felizes e não me chateiam e, consequentemente, eu fico feliz porque eles não me chateiam. O problema (mais outro) é que me dizem tantas vezes que sou estúpido, miserável, culpado e tonto que eu chego a acreditar que sou mesmo isso tudo. Perdi toda a minha auto-confiança, não acredito nas minhas capacidades, só na minha falta delas. E já viram quantas vezes repeti a palavra culpado no mesmo parágrafo? É para terem uma noção do estado em que estou...

Por não ser capaz de acreditar, não sou capaz de sonhar. Não sei o que é querer muito alguma coisa, desejar tanto algo  que sacrifico tudo para obtê-lo. Nunca pratiquei o verbo sonhar (a não ser sonhar quando durmo, mas mesmo os sonhos me são escassos nas minhas noites de insónia abundantes); nunca tentei procurar qualquer coisa que me satisfizesse porque nunca senti necessidade de me satisfazer. Por isso, pergunto como é que uma pessoa sabe o que realmente quer. Aliás, o que é querer? Podem não me responder à pergunta, não preciso da resposta.

Neste momento, analiso a minha vida e obtenho várias conclusões: tenho um emprego estável que não me diz nada; uma namorada bonita que me cumpre simples e desinteressadamente o desejo carnal (mentira, eu é que lhe saceio o desejo com puro sexo – com ela, sem ela, para mim tem o mesmo resultado); tenho uma família (ou não tenho família) que me quer ver bem longe e, quanto menos notícias tiver de mim, melhor... Olho para a minha  vida e vejo que é este o meu sacrifício aos deuses: nada, não ter absolutamente nada que faça sentido na minha mesquinha existência. Chamo-lhe sacrifício aos deuses porque é a única maneira que consigo encontrar para justificar este vazio. Tenho de me sujeitar a este remoinho de coisas inúteis e fúteis ao qual chamam Vida. Não tenho outra escolha e, enquanto Cá viver, tenho de carregar comigo todos os defeitos do mundo: o egoísmo das pessoas; a maldade delas; o seu veneno; a sua hipocrisia; o seu cinismo; a sua inveja... Tudo. E aliada a esta combinação espectacular de Mal, está a impossibilidade de eu poder ter algo que me motive, alguma esperança de um dia melhor, alguma vontade de fazer qualquer coisa, algum sonho pelo qual lutar.

Sabem, eu tenho uma conclusão, não escrevo isto tudo só para terem pena de mim. Se perceberam o que leram até aqui, sabem que a vossa pena não me afectará, é-me indiferente se vocês são boas ou más pessoas, se gostam de ópera ou se preferem uns tipos todos bêbedos a gritarem palavras ao som de guitarras berrantes... Não me interessa.

Só quero que saibam uma coisa e uma coisa apenas: sejam felizes por serem sonhadores, por terem desejos (nem que sejam os mais básicos), por poderem optar por outras alternativas... Porque desde pequeno que me ensinaram a sentir culpado e a não acreditar. Isso limitou-me a este cubículo “feio”.

Portanto, sonhem. Vale a pena.



D-Furikuri .~.!

música: BUTTERFLY
reflexo de turma 12º 12 às 18:22

link do reflexo | favorito
De para a beta a 2 de Março de 2008 às 12:05
eu sonho vale a pena, mas se precisar mesmo mt mt mt mt mt mt que um sonho meu se concretise recorrerei à make a wish foundatione digo que estou muuuuuuuuuuuuuuuuuuuuuuuuuuuiiito doente.
gostei, é motivador nem que seja pela miséria do narrador.
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