Chove. E pára. Aquela chuva de fios de nylon diagonais, tão leve que o vento empurra só com o querer. O lugar é o mesmo, exactamente o mesmo, a época semelhante, as mesmas personagens. Sensação de dejàvu, presságio comprovado. Devia-se acreditar mais nos instintos.
Tempo cíclico, talvez. Chego primeiro, espero o tempo habitual, aí vem como de costume. Não se faz nada, temos de arranjar pessoas, mais animação, socializar. Tudo idêntico e no entanto já houve tanta história por detrás deste presente tão passado. E na realidade isso nota-se, no conteúdo das conversas, que são o mais efémero.
O tabuleiro completa-se: todos os peões em jogo. É a vez de jogarem os peões um e dois. Por favor, meus senhores, podem avançar duas casas, apenas dois metros de distância. Agora está tudo pronto. Preparados? Pergunta retórica apenas, não muda nada se não estivermos, no fundo estamos sempre…natureza humana. E por falar em natureza, aí está ela a completar mais um ciclo, a rodopiar em volta do tabuleiro com a sua respiração sufocante de seres atarefados numa missão que não pode esperar.
Novo ciclo, novo tabuleiro, mais cartas na mesa. O que está lá é o que tem de estar, nada sobeja, tudo e naturalmente necessário, até o espaço em branco que não se sabe como preencher. Guardo-o no bolso para mais tarde. Olho o tabuleiro, reparo que os anjos da guarda voltaram das férias (Um pouco entorpecidos, é certo…). Agora é só ler as instruções.
Chove, com mais força agora. De vez em quando pára. Aguardemos o bom tempo.
Silvie
Hoje acordei e passei praticamente o dia todo a pensar em como estou longe deles. Em como sinto a falta deles. Em como os deixei sem pensar que os estava a deixar. Em como passámos bons momentos. Em como criámos boas amizades. Em como éramos unidos. Em como eu pensava que nada ia mudar. "Enganei-me", penso.
Ser amiga é difícil, sabem? Principalmente quando queres ser uma boa amiga e dar o melhor de ti e fazer tudo que podes pelos teus amigos porque significam muito para ti. Mas ser uma boa amiga é mesmo difícil, é tão difícil que me apetece desistir. Fico a pensar porque é que continuo a insistir e a esforçar-me para manter as minhas amizades, se a amizade não é um esforço nem sequer uma insistência. "Não há resposta do outro lado ou se há, é pouca." Talvez sou eu que espero ou exijo ou, melhor, preciso de mais. Existe uma frase em Latim, dita por Séneca: "Minus habeo quam speraui: sed fortasse plus speraui quam debui” – “Tenho menos do que esperei: mas talvez esperei mais do que devia”. Sempre dei e quis dar o meu melhor no que diz respeito aos meus amigos. E acho que cumpri o objectivo. Eles que digam se sim ou não. Não nego que desiludi pessoas, tenho consciência disso, mas também sei que as alegrei e as ajudei. Também não nego que me senti e sinto-me desiludida (às vezes), quando penso nos meus amigos. Não direi todos, mas os mais importantes. E isso é que é lixado. Haha...
Sou parva. Sou estúpida. E a culpa é minha. Penso que os únicos responsáveis pelas nossas acções somos nós próprios. Ninguém me disse para eu dar tanto, não é? Ninguém me mandou ser tão amiga. Eu apenas quis ser e quis dar. Ninguém pediu nada. E ninguém tinha de pedir. Acho que estou a exagerar quando digo “tão amiga”. Quer dizer, também cometi erros, também magoei pessoas. De certeza que os meus companheiros não gostaram de atitudes minhas.
Não mostro muito o que sinto de negativo. Tento manipular as coisas más e transformá-las em boas. Muitas vezes, falho. Haha... Mas continuo a não demonstrar esses “pormenores” infelizes. Sempre e, agora mais do que nunca, quero ter a ousadia de arriscar. De poder mostrar as coisas negativas que sinto. Apetece-me rebeliar, tornar-me rebelde, sim, partir a loiça toda! Assim seria tudo mais fácil... Acredito cada vez mais que existem aquelas pessoas que nascem para não pensarem no que fazem e aquelas que nascem para tudo cumprirem. Eu nasci do segundo tipo, querendo ser do primeiro.
Apetece-me fumar, apetece-me gritar com as pessoas, apetece-me bater em alguém, apetece-me ser mal educada, apetece-me responder mal às pessoas (ok, isso já eu faço de vez em quando), apetece-me ter maus resultados, apetece-me ser irresponsável, apetece-me não pensar no que estou a fazer, apetece-me ir contra tudo aquilo que eu defendo, apetece-me ir contra mim própria e ser aquilo que não sou. Apetece-me ver a cara de estúpidas que as pessoas farão se me virem a descambar por aí, a fazer tudo ao contrário. Apetece-me acabar com as expectativas (ou falta delas). Apetece-me rebentar com isto tudo. Mas fico-me pelo apetecer... A consciência e a racionalidade e a responsabilidade inatas e condenadoras de mim própria impedem esta revolução (mas não a vontade).
Apetece-me esquecê-los. Quero (ou não) um novo grupo de amigos que os subtitua. Estou cansada e triste de esperar por coisas que eu sei que não vêm. Cansada de dar sem receber. Não quero com isto dizer que só dou para ser recompensada, mas é normal que uma amizade entre duas pessoas seja recíproca, não é? Mas não sinto mais que as minhas amizades sejam dos dois lados. Talvez esteja a ser injusta com eles. Mas é o que eu sinto. Desculpem. (Vêm? Porque estou eu a pedir desculpa? É o que eu sinto! No entanto, peço desculpa porque posso estar a magoar alguém. É isto que eu gostaria que não acontecesse. Queria poder não pedir desculpas, queria poder ser mazinha, deixar de fazer as coisas certas, deixar de ser boazinha...).
Volto a afirmar: ser uma boa amiga é difícl, sabem? Tão difícil que me apetece desistir. Só que, para variar, fico-me pelo apetecer... Quando eles ocasionalmente dão sinais de vida, o “apetece-me” desaparece. E, por isso, sou parva, estúpida e culpada. Nem que digam que sentem a minha falta porque acham que cai bem ou então porque pensam que devem dizê-lo mesmo que não o sintam, eu acredito. Eu acredito porque eles são eles, os meus amigos. Os que mais significado têm para mim, (in)felizmente.
Acho que não conseguiria dizer isto sem ser através da escrita. Mas prometi a mim mesma que não me deixaria enganar por palavras, nunca mais. Nunca mais mesmo porque elas são traiçoeiras e, normalmente, representam promessas que não se cumprem. No entanto, estas palavras mais sinceras não podiam ser.
o porco foi criado e alimentado. sentava-se à mesa, comia os seus irmãozinhos sacrificados em nome da sua engorda.
era adormecido perto da lareira, e "meu filho, um dia estarás lá dentro", e "sim papá, quero seguir as tuas pisadas".
e nesta época festiva e calórica um dos melhores eventos é certamente o desacato ao corpo, a carniçaria e as sangrias.
já está o acarinhado porco de família, espécimen educadíssimo, esmigado, no folar e a olhar lá de dentro para o cu do ovo cozido.
peço desculpa, Gonçalo Julião.
Bien-sur, saio de casa e deparo-me com uma multidão. É certo que há quem não tenha moral para sair de casa, quanto mais se enfiar numa multidão, por ser vulnerável, mas o ser humano é um ser que vive para a confissão, para a vergonha, para a mesquinhez, logo saio e desabafo: “Fui eu que o matei! E volto a fazer se não me saírem da frente, ó seus porcos!” Fosse possível saber porquê mas afastam-se todos. Quer dizer, dão dois passos para trás e esperam que eu deixe todos os pormenores sórdidos do meu pecado num testemunho assinado contudo não tenho paciência, estando ela enferrujada, há algum tempo que o ser humano deixou de fazer alongamentos de paciência, algo que lhe fez mal, é bom notar.
Fujo-me da multidão e agora sim, vejo o céu, vejo o sol, vejo as árvores, vejo os passarinhos, vejo-os a cantarem canções, vejo-os felizes e é amor, é primavera, é todas essas coisas enquanto os passarinhos regurgitam as senhoras donas minhocas e presenteiam aos filhos um bom pequeno almoço, pelo menos aos que não foram transformados em ovo estrelado aquando da sua cela quebradiça. Os semáforos já estão longe, agora encontro-me ao pé da nova biblioteca da Amadora, olvido o nome, é o que acontece quando se dá nomes de pessoas às coisas, para erudição mais valia escreverem logo em latim e aí é que as pessoas não iriam perceber mesmo nada para além das semelhanças parentescas. Fosse um nome como “Tu és um suíno” as pessoas dificilmente o iriam esquecer, se bem que pudessem tomar mais atenção ao nome do que à biblioteca. Se bem que, se todas as bibliotecas tivessem verborreia verbal como nome, pouca diferença faria pois se esqueceriam tal como nos esquecemos agora das que têm nomes eruditos. Bem já chegam de nomes, que sem eles, as bibliotecas não existem, pronto, esta parou de existir, voltou a ser o parque de estacionamento que era antes.
“O meu filho já pensou como Deus o poderia ajudar no planeamento familiar Está a pensar ter filhos?” Ora minha senhora, tomara ele que ninguém os tivesse e não estaríamos a ter esta ridícula conversa.
“Aí, sócio, tens cinquenta cêntimos?” Não, só cinquenta euros, tens troco para tal? “Ya, ya, passa aí”. Efectuamos a transacção e fico eu cinquenta cêntimos mais pobre e ele cinquenta cêntimos mais rico.
Passo pela Escola Secundária da Amadora. Outrora isto foi um jardim mouro cheio de amendoeiras, foragido do Algarve, agora é um esgoto séptico repleto das mais venéreas doenças ambulantes, cada mutilação à humanidade que aqui anda mais horripilante que a outra. E isto falando só dos de décimo, nem me ponham a falar da hipocrisia dos velhos. Pois bem, porque aqui vim, não faço ideia, digo vim como quem diz não vim visto que ainda me encontro em casa, já não a reflectir em latim mas como me pus a reflectir em isto tudo e lá se perdeu mais um pouco do “Illo tempore” com estes pequenos apartes mentais, perde-se conhecimento, ganha-se o momento, tudo isto no meu quarto às oito e quarenta de uma manhã de sábado de Março, o céu amarelo e azul como num quadro que foi pintado hoje por algum ser celeste. Celeste, que palavra tão bonita…
João
Chego. Sento-me na cama, ligo a televisão mas não a oiço (devo gostar de gastar electricidade em vão). Oiço música para não conseguir ouvir os meus pensamentos. Não vale a pena, o canto pensado é mais alto.
Reflicto. Assumo que não tenho nada a perder, percebo que não quero dar passos em falso, não mais do que já dei, por isso temo. É tudo demasiado formal para não temer quebrar a barreira invisível e impenetrável, tão tensa como aquelas redes eléctricas que dão choques consideráveis. Ajo e anseio. Preciso de alguma alienação de quando em quando.
Desconheço o que ficou percebido ou não. Assumo que não sou uma pessoa fácil de perceber (em todos estes anos de vida nunca consegui tal proeza), mas sei que sou tolerante, quando tenho de ser e as vezes quando não tenho. Tolerante comigo desde que nasci. Como não haveria de ser com tudo o resto, em toda a parte?!
Organizo pensamentos. Imagens que flutuam na minha mente, reminiscências, teorias de que não tenho certeza nenhuma… organizo-as como um puzzle de quatro peças apenas, mas que não encaixam em lado nenhum.
O certo é que se deve viver para fora. Toda a gente deveria saber isso (uma utopia, mais ainda na prática). Mas ás vezes não é fácil lidar com a exposição individual e sagrada. Não é mesmo! Muita vulnerabilidade envolvida. É como sair de casa de manhã e depararmo-nos com uma multidão. Quem pode censurar o – voltar para casa e esperar que a multidão passe -que atire a primeira pedra. Eu, nem pedras tenho, quanto mais moral!
Silvie
mais um dia sim.
vou só passar a dissertar num ontem. o ontem foi um jogo puxado... vá, fingimento nunca me custou, mas, neste jogo o disfarce foi muito elaborado. um jogo reles diria.
senti nauseas absurdas.
logicamente e conclusivamente fiquei bastante cansado. então dormi pesado.
o hoje foi brincadeira de crianças. se as crianças fossem cruéis e mentirosas, teria sido uma brincadeira fútil, em que tenho o meu próprio cantinho, um quadrado bicudo de areia. a areia é tão versátil...
n'hoje, vi um irregular espectaculo celeste a 3D. tanto artificio, tão bem produzido, tão meticuloso, que matutava se seriam aqueles, as nuvens. não isso foi n'ontem. n'hoje foi mais o sol da tarde que, se não fosse por entardecer às 17.30, poderia ser um autêntico sol de Junho. algo falsamente doirado como os candelabros mafrenses dos franciscanos...
que não haja mais dias assim...
10/01/08
gonçalo julião
(Espero que não se ofendam, veio-me à cabeça e sei que não tomarão isto mal, mas mais vale prevenir que remediar… Suponho que poucos perceberão todo o pensamento dado a este texto, se bem que o elefante já tenha desaparecido…)
Encontrava-se o cá vosso locutor, José d’Egardes, muito bem posicionado numa posição em que o seu traseiro se encontrava paralelo com o assento onde por acaso assentava o dito cujo, e ocupava-se de ler o seu caro periódico e o insolitamente fascinante caso de um labrego severamente ataco por um caso crónico e agudo de elitrorragias, quando prontamente fui interrompido de tal sério assunto pelo meu companheiro e outrora amante, Maquiavel Pimentão.
“Maldita seja aquela pústula maligna e a desditosa que a parturejou!”, que traduzindo num português mais acessível ao auditório seria algo da linha “Maldita **** e a **** que pariu aquela **** em primeiro lugar!”. Isto, meus caros ouvidores, era o discurso claramente conciso e organizado de Maquiavel Pimentão.
Não pensem que por isto, meus inequivocamente erróneos amigos, que este belo exemplar de homem culto, erudito e de uma educação exímia, da qual se algum imberbe alguma vez vos comunicar alguma falta ou defeito confiem na palavra de quem sabe, será pura e mais falsa mentira!, não se deixem descair na ideia que tenha por costume Maquiavel ser assim tão excessivo nos seus queixumes paridos. Apenas se adequa aos problemas que ele tinha que aqui reporto:
“A miserável da minha safada gata - ”
“Aquela sobre a qual não aceitaste o meu conselho em excisar?” Prontamente interrompi para poder determinar sobre qual miseravelmente safada felina ele neste momento detinha a sua atenção.
“Essa mesmo. Pois bem, o meu caro colega acredita que não sossega enquanto não me irrita, no sentido mais latino da palavra, pois com os seus arranhões dos quais não se trava de me dilacerar e incisar as minhas coutadas pernas, provocou-me das mais curiosas infecções e irritações de pele que até a um sauvant dermatologista licenciado em Harvard e cuja mulher se chamasse Epicleste Derme e fosse o equivalente dérmico a um Einstein ao quadrado seria capaz de me as diagnosticar? Mas o mais interessante e fascinante no caso, é que juro!, pela memória da minha mãe-
“Que ainda vive e está de perfeita saúde…”
“Sim, mas que de memória é que não, eu juro pela minha mãezinha… Que a teimosa da gata me arranha apenas com o único e certo propósito, tal como é certo eu ter de nome Maquiavel Pimentão, o de me provocar, pura e simplesmente!”
Mantivemo-nos silenciados por breves momentos.
“Isso ou então devias parar de bronzear as tuas pernas com atum.”
“Ou isso.”
Pois bem, já lá foi o meu caro amigo e mesmo na altura certa que agora vejo que chegava Carina Sibila, a de Marrocos, a que partilha uma caserna comigo nas reuniões de Comunistas Confidenciais, e vêm acompanhada de duas amigas, irmãs gémeas, cada uma mais bonita que a outra e no entanto tão fechadas e impenetráveis quanto túmulos de virgens Vestais e tão devotas na sua qualidade de sombras pálidas, se bem que bastante presentes, da Marroquina, que se acharia tratarem-se elas quase como próteses da jovem rapariga.
Bufando e arfando, com o seu colar angelical, soando quase ao vibrar de um guizo de um gato, será irónico porventura, tendo em conta ser ela treinadora dos gatos e vem com má cara, após ter encontrado Maquiavel Pimentão, animal que ainda não foi capaz de domesticar. Ninguém sabe quem insultou o outro primeiro… Qui ça, não fora apenas um insulto que estivesse por lá a passar, inocentemente a apreciar a vista e eles o tivessem apanhado e seguido o seu raciocínio d’ódio (Não haverá país neste mundo onde possa um insulto andar livremente na rua sem que tenha que ser discriminado pelo simples facto de ter nascido insulto?) Discutiram pois, que se há de fazer, pergunto-lhe para a ouvir responder apenas “Castração”. Melhor não falar, queira eu proteger as minhas virtudes de homem e poder satisfazer a minha futura mulher na minha futura noite de núpcias.
Não é de cara que se querem e não se entendem? Deus tenha paciência, que eu tenho olhos e espero por vê-los os dois ainda. Por enquanto, satisfaço-me olhando de soslaio as gémeas mudas.
José d’Egardes
Bernardo Cão
acordo morosamente entre margens.
margens.
acordando, estendo os braços, ambos, não alcançado porém
nenhuma. que ventos ou
minguantes me naufragam.
não tentarei.
escarneço.
o resultado será sempre insatisfatório para dois. se
o resultado será incondicionalmente a esquerda e encalho.
29/02/08
from the farm: pirua.
. 091009
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. (...)
. Onanismo
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