Terça-feira, 30 de Outubro de 2007

Adeus

Já gastámos as palavras pela rua, meu amor,
e o que nos ficou não chega
para afastar o frio de quatro paredes.
Gastámos tudo menos o silêncio.
Gastámos os olhos com o sal das lágrimas,
gastámos as mãos à força de as apertarmos,
gastámos o relógio e as pedras das esquinas
em esperas inúteis.

Meto as mãos nas algibeiras e não encontro nada.

Antigamente tínhamos tanto para dar um ao outro;
era como se todas as coisas fossem minhas:
quanto mais te dava mais tinha para te dar.
Às vezes tu dizias: os teus olhos são peixes verdes.
E eu acreditava.
Acreditava,
porque ao teu lado
todas as coisas eram possíveis.


Mas isso era no tempo dos segredos,
era no tempo em que o teu corpo era um aquário,
era no tempo em que os meus olhos
eram realmente peixes verdes.
Hoje são apenas os meus olhos.
É pouco mas é verdade,

uns olhos como todos os outros.


Já gastámos as palavras.

Quando agora digo: meu amor,
já não se passa absolutamente nada.
E no entanto, antes das palavras gastas,
tenho a certeza
de que todas as coisas estremeciam
só de murmurar o teu nome
no silêncio do meu coração.

Não temos já nada para dar.
Dentro de ti
não há nada que me peça água.
O passado é inútil como um trapo.
E já te disse: as palavras estão gastas.

Adeus.

[Eugénio de Andrade]


     Porque tudo termina e nada é eterno... Quando algo acaba tanto pode restar a saudade como as recordações ou ainda um alívio e uma sensação de paz pois nem tudo é mau...

                                                                                                                   Daniela Freitas

sinto-me:
reflexo de turma 12º 12 às 17:54

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Sábado, 27 de Outubro de 2007

17.45

       David João Filipe: Do meu coração fugido, a cara doutora Filipa D'Lima. Pensei em dar-lhe um estatuto honorário nem que seja por uma vez, pelo seu texto ser tão bom.

      

17.45

 

 

17 horas e 45 minutos.

Seguindo um passo calmo e rítmico entrei no metro com o mp3 ligado no volume máximo. A cultura massificada do século XX sufocava-me especialmente. As personalidades clonadas eram-me hoje inadmissíveis, qualquer conversa era um pretexto para criticar o mundo em que vivo.

A carruagem estava vazia e sentei-me ao pé da janela. A primeira vez que andei de metro foi com a minha avó Teresa e disse-lhe que me queria sentar à janela para ver a paisagem. Há 6 anos que me sento sempre à janela e relembro esse dia.

Inevitavelmente, as músicas transmitem-nos estados de espírito característicos e eu estava a ficar cada vez mais deprimida. Desliguei o mp3. O silêncio da carruagem vazia e o som inconfundível da contagem das estações passadas eram ainda mais insuportáveis. Embora tivesse entrado no período de férias de verão continuava a ler livros sobre História, principalmente sobre a civilização romana. A distracção da sensação de sentimentos aprisionados era o que mais valorizada nessa altura. Através de guerras entre romanos e bárbaros abstríi-me da minha sociedade contemporânea.

Desviei o olhar da minha batalha e encontrei um olhar apaziguador que me mirava. Um largo sorriso unilateral se rasgou rapidamente, perfeitamente sedutor. Sorri em resposta mas rapidamente voltei para o grito ensurdecedor de Júlio César.

Esses olhos, de um castanho profundo que ninguém ousa comparar ao azul dos céus, não se separavam do meu rosto, disso eu tinha certeza. Sentia-os a queimar a minha pele e uma vontade inevitável de olhar novamente sobrepôs-se ao que me tinha imposto a mim mesma. Era só um olhar.

Os seus olhos não se desviaram. Permaneceram e intensificaram-se. Mais fundo na minha alma nua e desprotegida. Conheceu-me mais do que alguém poderá conhecer apenas num olhar poderosamente sabedor. Escondi o que pude.

Ele sentou-se ao meu lado, as guerras de Roma esquecidas no tempo e no espaço, a mão dele no meu rosto. Beijou-me ternamente e eu soube-o nessa altura, que era para sempre. Ele verbalizou-o e fomos um do outro nesse instante partilhado de silêncio único e perfeito. Nesse silêncio falei-lhe mais que em palavras alguma vez ditas com sonoridade e a beleza desses sons silenciosos foram a resposta às minhas dúvidas. Não mais escondi o que ele analisava tão superfluamente, tão devagar até chegar ao ponto central de uma profundidade inatingível por qualquer humano.

As estações passaram e as carruagens encheram. À nossa volta corpos imundos, suados e cansados, usados e desgastados, em pé e sentados. Humanos sem vida, cinzentos e de olhar morto. Éramos a sua inveja, sem sabermos o nome um do outro, sabíamos que era para sempre. De mão dada e palpitações compassadas.

Lentamente, a força da mão dele foi-se desvanecendo, a minha mão foi ficando solta. Lentamente ele levantou-se, nunca tirando os olhos dos meus. É para sempre. Saiu nessa estação sem olhar para trás, largou o meu olhar sem controvérsia nem remorso.

As portas do metro fecharam-se, o metro começou a andar. Ele não olhou para trás, os seus passos eram descontraídos, e não voltou.

Os meus olhos nas costas dele. O metro afastava-se velozmente em direcção ao túnel e em segundos vi o meu rosto na janela do metro, sozinha.

Não sei qual é a próxima estação.

 

Filipa D’Lima Outubro 2007


 

        Vá, toca a comentar!!!!!!!

música: Somewhere Over The Rainbow
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reflexo de turma 12º 12 às 22:13

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Quarta-feira, 24 de Outubro de 2007

Lost

Sometimes I just wish we had a moment
To sit down like we used to
To hang out like we used to
Just to be together
Like we used to.


Feels like everything’s fading away
No return, no sacrifice
No will, no joy,
No time to be friends
Like we used to.


Memories are coming and going
Can’t catch, too fast
Can’t break, too hard
Can’t forget, too sad
Just wish to be like we used to.


Innocence is gone
People make their way through
I imagine myself being here,
And being there
A place I don’t belong to.


Sometimes I just wish we had a moment
To sit down like we used to
To hang out like we used to
Just to be together
Like we used to.



It’s hard enough to accept
The unacceptable changes
Turn around the corner
To face the world:
What we were no longer is true .
Other paths have crossed our way
To release the evil fate
We’re no more, we’re nothing
We’re poor, we’re disgraced.



And yet…




Sometimes I wish we had a moment
To sit down like we used to
To hang out like we used to
To be together
Like we used to.


 

                                       But I know is possible no more…
                                                                        Or maybe.

D-Furikuri *
sinto-me: Pensativa
música: Thank God I Found You - Mariah Carey
reflexo de turma 12º 12 às 13:17

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Sábado, 20 de Outubro de 2007

Parabéns a nós!

 

Hoje fazemos um ano!!! Parabéns a todos nós!

música: parabéns a você
reflexo de turma 12º 12 às 13:18

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Quarta-feira, 17 de Outubro de 2007

a única palavra & uma única palavra

para ti: uma palavra atrasada.

 

hoje...foi mau, pior.

venho sentindo uma solidão tão reprimente. frequento um espaço tão populado mas não encontro quem me queira apelar por carinhos e recordações...

sinto-me tão inútil, hoje...pior.

quis tanto partilhar o peso de eremita que venho carregando, e foram-se desviando os apoios, e a palavra daquela traduziu-se numa despedida, têm vida para viver e adeus depressa se forma na minha alma como um tumor, melhor, uma bolha, caindo tão frágil rebentando na mão calosa de carregar monolitos num dia mau, tão pior, pesos traduzidos duma ansiedade venenosa, que me prende os movimentos, cala os consolos...assim...dependente. agora pondo a simpatia de lado, estou neste momento a ser a coisa mais rastejante e despresivel que já te escreveu, que já sentiste, não sentes isso? tu sentes. tu sentes. és dura. e soubeste dizer-me quais flores iriam ser comidas pela geada. pressentes quais os destinados a esmorecer.

hoje. hoje, sim. uma música me ditou a angústia. até aquela merda de música segregada de carrascos e de falhas de consciência...até. deixo as maravilhas em estilhaços. transformando-me num conto sombrio, faço capitulos tão puros, tão desesperantes, tortuosos, levando as mãos à cabeça, voando escadas abaixo abafando crimes penosos. é a única vida que tenho, a única conversa, a única imagem dos meus dias, d'hoje, d'amanhã. quis partilhar. agarra um pouco disto. partilha. por favor. a palavra.

sento-me invadido por espasmos que me arrepiam e coçam as chagas.

sei que um dia vais querer responder à provocação, ao pedinte.

é só um bocadinho que quero dar. podes levar o mais pesado, eu sei que o podes fazer. por favor. por favor. tu podes, podes.

um sopro teu vai criar inóspitos divãs para que padeça.

agarra. tu podes. padeço.

sei que posso esperar a resposta para esta terceira carta, a única palavra.

sabes os infortúnios que nos derrubaram a ambos. sabes, sim. porque hoje, eu caí, pior que tu.

 

da incompensável necessidade de dias melhores.

uma única palavra

para ti: esta carta vai ser extraviada.

 

caíste pior que eu, assim seja.

não dou esmola aos destinados a esmorecer.

os pesos que tens de carregar não serão compartilhaveis, independentemente das vezes que os queiras legar a outros.

ninguém quer a miséria que te foi facilitada. a agonia e a vida de cão a que te candidataste. tu não sabes. ninguém quer. a que quiseste.

adeus.

gonçalo julião.                                               17/10/07

 

reflexo de turma 12º 12 às 19:41

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O Luar do Absolutamente Coisa Nenhuma

 

Foram dias incontáveis de nevoeiro. A chuva indecisa surpreendia de quando em quando os mais temerosos e pessimistas. Anoitecia cada vez mais cedo e a noite, densa como o dia, indistintamente. Nenhuma catástrofe prevista, nenhuma profecia; nada de passados com futuros à mistura. É apenas meteorologia. O céu tem sono, nada mais.

                Envolvo-me. Não há nada a envolver. Envolvo-me em mim, nebulosamente. Sou um todo perfeitamente em sintonia solidária entre a terra e o céu.

                Passeiam grupos de pessoas que não são comuns aos olhos que as contemplam com afectiva habituação. Passeiam rente ao rio calmo, calculista e límpido como qualquer pensamento que pudesse inocentemente passar pela mente de qualquer um deles. Duvido que haja algum pensamento suficientemente hiperactivo para passar neste momento.

                As palavras são intrusas e apetecem, com uma fome, famintamente formal. Aparentemente nada do que apetece acontece. Apetece que chova e não chove, ou que faça sol e não faz. O habitual torna-se indesejado.

                Talvez pudessem fazer sol em conjunto mas é utópico e extenuante. Chover é do mesmo modo sadismo. Partilham-se, são singular, são um todo, são o céu duvidoso, o mundo. São o aqui e agora, a noite de todas as noites diurnas, eternamente numa única, insignificante noite, subjectivamente longa e indolor.

 

 

 

Sílvia

reflexo de turma 12º 12 às 16:52

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Domingo, 14 de Outubro de 2007

Doris Lessing - Nobel da Literatura 2007

Any human anywhere will blossom in a hundred unexpected talents and capacities simply by being given the opportunity to do so.

 


I don't know much about creative writing programs. But they're not telling the truth if they don't teach, one, that writing is hard work, and, two, that you have to give up a great deal of life, your personal life, to be a writer. 


In the writing process, the more a story cooks, the better. 


That is what learning is. You suddenly understand something you've understood all your life, but in a new way.



There are no laws for the novel. There never have been, nor can there ever be.


Think wrongly, if you please, but in all cases think for yourself.


With a library you are free, not confined by temporary political climates. It is the most democratic of institutions because no one - but no one at all - can tell you what to read and when and how. 

 

Doris Lessing

 

in http://www.brainyquote.com/quotes/authors/d/doris_lessing.html 


a prof

reflexo de turma 12º 12 às 14:51

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Sábado, 13 de Outubro de 2007

Pessoa de Pessoas

              É-me difícil dizer se este texto se encontra ou não acabado. Neste momento, tudo o que sei dele, é que é o lado B do "Parvos":


                                             Pessoa de Pessoas

 

Eu não sou uma pessoa de pessoas. Eu não gosto de pessoas. Eu não gosto de grupos. Não gosto de andar de comboio, autocarro e metro, porque estão sempre cheios de pessoas. Não gosto de andar nas ruas, porque andam lá sempre pessoas. Detesto edifícios públicos, como as escolas, as câmaras , os pavilhões, os teatros, cinemas, centros comerciais, as praias, os parques, detesto tudo isso. É um peso enorme andar no meio da multidão.

            Gosto de falar com alguém, sim. As minhas noites mais bem passadas foram passadas a falar, no meu quarto. Mas só gosto de ter comigo uma pessoa de cada vez. E as pessoas que queiram ficar junto de mim têm que ser pessoas especiais. Têm de saber rir e saber chorar. Saber do que eu falo sem explicar. Têm que me amar e, mais que isso, eu tenho de amá-las. É por isso que muitas das pessoas que me querem nunca chegarão a falar comigo sozinhas. Não lhes darei essa oportunidade. Não gosto ter que aturar todas aquelas conversas de circunstância das pessoas que não sabem apreciar as conversas silenciosas , não gosto de falar sobre o tempo com os estores fechados, nem gosto de pensar para conseguir falar. Falar é-me algo inato. Vivo para falar, para me organizar através da fala, para me perceber e perceber o meu mundo. Um mundo mudado.

            Às vezes, eu simplesmente olho em volta deste nosso mundo coberto de graffiti’s , repleto de adolescentes com os seus sentimentos adolescentes, dos velhos caquécticos e pedantes, dos empregados das firmas multinacionais, de tudo e tudo e simplesmente penso que posso desaparecer neste planeta sem inocência. Seria fácil, mesmo com o fardo que é a multidão. Apenas vestia uma t-shirt e cortava o cabelo. Punha umas calças de ganga e ténis, e pronto. Saia de casa para me misturar no tráfego humano. Viveria eterna e anonimamente, sempre caminhando, perdido no meio da mediocridade. As pessoas. O ser humano. Um projecto falhado e autodestrutivo . Um ser sem voz que caminha para uma cova mais próxima do que pensa. Porque ninguém, mas ninguém te ouve, numa multidão, falando todos simultaneamente, pronunciando as mesmas sílabas simetricamente, com os seus auscultadores de telemóveis perfeitos. Porque é isso que se é, quando se caminha com todos: Mais um deles. Mais um mentecapto que se acha normal, mais um que se sente como as pessoas normais se sentem. Serás apenas mais um que chega a casa às sete e meia, mais um que vê as mesmas novelas, mais um que critica as mesmas coisas. Tornas-te nos glóbulos vermelhos provenientes de uma medula óssea cancerígena, o sangue da Sociedade, fluindo abruptamente em veias destruídas e carcomidas pelo colesterol e anos e anos de fast-food . E acabas por te tornar nisso: Um ser sem nome e sem voz, uma carcaça ambulante em decomposição lenta. É por isto  que eu não gosto de andar de metro.

            E o que é mais estúpido é que as pessoas avaliam as outras pessoas pelo o que deviam vestir e não pelo o que se lhes adequa devido a esta “comunidade”, percebem? Por exemplo, um uniforme de polícia: um polícia usa um uniforme universal, nunca um feito à sua medida. Nunca de acordo com os seus gostos. Já vai a lengalenga que moda, para um homem de negócios, é a cor da gravata. Agora, tirem o uniforme a um polícia e ele deixaria de ser polícia? Não, continuaria a ter os mesmos conhecimentos da lei e a mesma estúpida arrogância de quem sabe estar acima dela, mas sem o uniforme, ninguém mas mesmo ninguém respeita um polícia. Porque o uniforme insere o polícia como parte da comunidade policial. Sem o uniforme, o polícia é apenas mais um Zé-Ninguém, e como tal, não tem a capacidade de exercer a sua função. Sem o uniforme, é ostracizado por quem é suposto defender.

            Agora imaginem, imaginem apenas, que eu me vestia com uma saia cor-de-rosa e um chapéu de coco verde-ranho e saísse para o meio da estação de metro do Rossio. Seria morto. Primeiro seria gozado, depois insultado e censurado e por fim resultaria de certeza numa agressão contra mim por parte de um qualquer primata com polegares oponíveis. Apredejariam-me até à 24 de Julho, mesmo eu não tendo a menor ideia de onde fica. Cruxificariam-me . Porquê? Porque estaria a insultar a sua sociedade, subconscientemente, ao usar uma saia, uma vestimenta fora de comum num homem. Seria contra natura, um ataque aos valores e tradições que tanto prezam! Seria uma afronta ao pudor instituído! E como todos sabem, os que vão contra o rumo da maré são empurrados e naufragados. Postos de parte.  

            E é isso que me irrita nestes idiotas… São demasiados estúpidos, todos eles, das meninas de treze anitos que devoram qualquer boys band que esteja na moda, desd’os universitários que s’intitulam “alternativos” até aos velhos decrépitos que apregoam a tradição, enquanto que na sua juventude, fizeram de certeza o mesmo! Não vos põe furioso saber que tantas pessoas e tantas almas odeiam e querem fazer sofrer com todo o seu sádico desejo todos os que vestem o que se lhes adequa aos gostos e não o que era suposto usarem? A mim enche-me de um nojo que me apetece fazer como o Alan Moore , e dar de frosques . Lá ia eu, para uma cabanazita algures nos campos do Alentejo ou do Alasca.

            Desculpem-me se eu estiver a ser demasiado... pessimista e negativo e tétrico. Mas é assim mesmo. Não suporto a ideia de alguém ter que morrer no anonimato, apenas para ser aceite pelos seus iguais. Qual é o motivo que leva as pessoas a calarem-se e a vestirem-se normalmente? Qual é o motivo que as leva a nunca tomarem aquilo que querem, mas o que os outros querem para elas? O motivo das marcas e All-Star’s ? O motivo que leva as pessoas a ridicularizarem quem não fala como elas ou fornica o sexo que elas fornicam? (Para não usar uma escolha mais vulgar de palavras).

            Há quem se queixe que a Sociedade Moderna, a Máquina que gere toda a enorme massa de adubo a que chamamos Humanidade, perdeu a sua inocência. Devido ao sexo na televisão. Devido à violência nos jogos. Devido às drogas na rua. Devido ao hip hop e rock and roll . Devido àquele e ao outro, a este e ao acolá, a ninguém e a todos. Eu concordo. A Sociedade já não é inocente. Mas não devido à televisão e aos jogos e às drogas. É devido à informação. O Mundo tornou-se subitamente, no século XXI, um paraíso , um enorme continente informático. Por todo o globo, as tradições quebraram-se, por todo o lado as portas da comunicação mundial abriram-se e todos quiseram fazer o mesmo: entrar com na moda. Andar na mesma onda. Falar a mesma língua , ver os mesmos programas, arranjar os mesmos carros, comer a mesma comida feita de plástico reciclado e cartão velho. Por ironia extrema, as portas da comunicação fizeram com que todas as vozes inteligentes se calassem e uma ditasse: a voz burra e ignorante da multidão. A Sociedade perdeu a sua inocência quando deixámos de pensar por nós mesmos. Quando a primeira rapariga gritou ao ver os Beatles, nunca mais houve um silêncio nesta face inóspita da Terra. E sabem o que aconteceu aos Beatles? Pararam de actuar, porque não se conseguiam ouvir a si e à sua música no meio dos gritos histéricos, a verdadeira bomba atómica desta geração. Foi nesse momento que se perdeu toda a inocência, todo o potencial humano que tanto se vê no mundo.           

Detesto toda esta ideia de conversão. A religião foi a primeira nódoa na inocência do mundo. Para mim, tanto um satanista convicto quanto um ferrenho cristão são ambos culpados do mesmo pecado: do fanatismo, a partir do qual começam a impor as suas visões de vida às outras pessoas. Os terroristas fazem-no explodindo aviões, os cristãos através do tele-evangelismo . Tentando pregar a Iluminação, quando nem ouvem o outro lado. Calando todas as vozes, em função da sua.

            Claro que falo como se fosse eu o Iluminado. Falo, pregando a minha visão das coisas, a minha visão de que toda a religião e toda a perversão da inocência é necessariamente humana, sendo uma cristalização das superstições de uma determinada sociedade “primitiva”, devido à falta de avanço tecnológico. O Sol desaparece à noite, porque ele é na verdade uma grande carroça governada por um homem do céu… Existe um gigante vouyer lá em cima e quando uma pessoa vence um cancro, é “graças a ele”. Não devido aos médicos reais, mas sim devido a esta identidade sobrenatural que nunca ninguém viu. Apenas vem escrita num livro muito, muito, mas mesmo muito antigo (a antiguidade é obviamente sinal de veracidade. Daí nunca devermos desrespeitar os nossos pais e muito menos os avós.): A Bíblia. A Torah . O Alcorão. Como quer que lhe chamem, eu chamo-lhe o maior jogo de telefone da História. A maior voz da Multidão. Os discípulos de Jesus Cristo são ovelhas, carcaças mudas e cegas que são conduzidas pelo pastor ao matadouro. Claro que falo como se fosse eu o Iluminado. Como se fosse eu o “não-conformista”… 

            Mas e esses atrasos de vida que se gostam de apelidar de “não-conformistas”? Os que se revoltam contra a máquina apenas para seguirem modas e rodas, não se apercebendo que a sua pequena rebelião faz parte das engrenagens da mesma engenharia contra a qual combatem? Estes abortos, estes incapacitados que não são capazes de perceber que tudo, tudo o que fazem, toda a pequena acção, desde comprar aquela pêra meio tocada para comer ao pequeno-almoço vegetariano (são sempre vegetarianos) até à compra dos comprimidos para dormir com os quais vão fingir uma pequena e desesperadamente patética tentativa de suicido, tudo isso é uma consequência da forma como foram educados. Toda a sua pequena rebelião, a maneira de organização e os seus ideais, isso tudo contra a Sociedade, tem fundamento na Máquina em si.

            Não-conformistas… Idiotas. Uma pessoa não consegue ir contra a sua sociedade, nasceu dentro dela e o seu cérebro encontra-se formatado pelos seus regulamentos e padrões, que até o seu discurso, a sua organização de ideias baseada em linguagem é tudo com base nesta nossa Mãe odiada (Mas também, quem aqui nunca se zangou com a sua mãe?). Para ir contra ela, seria necessária a criação de toda uma outra forma de discurso por parte de quem se revoltasse, toda uma outra forma de expressão que fosse contrária àquilo que a Sociedade defende. Infelizmente, esta nova forma de discurso que fosse criada, teria, inatamente, o cunho da nossa sociedade, pois, apesar de argumentar contra ela, é um produto desta mesma, no sentido em que foi criada por um individuo formatado (inconscientemente, desde a nascença) pela Máquina. Esses que gritam por revolta comunista, abafando os apelos da mensagem de liberdade solitária, os suspiros do individuo, o prisioneiro da Multidão.

            A revolta é um produto tão formalmente aceite como qualquer outro produto desta enorme cristalização a que chamamos vida humana. Simplesmente nem os não-conformistas nem os conformistas se apercebem disto. E eu? Eu sou filho do meu pai. Fruto do seu ventre. Sou filho da minha Sociedade mas confesso os meus pecados. Tento não ser não-conformista tanto quanto tento não ser conformista. Talvez eu seja, daqui, o pior de todos, sendo o indeciso e o Não-Definido . Eu, que não ando de mão dada com as modas. Eu, que prego contra pregadores pregados a cruzes. Eu, que declarei não-conversão enquanto vos tento converter à minha razão. Sou realmente filho da minha Sociedade e engrenagem da minha Máquina. É esta verdadeiramente a nossa divindade; não Yaheew, Deus, ou Alá, mas sim fast-food , pornografia e um idoso sem abrigo a morrer a cada esquina. Não adoram fazer parte da nossa grande raça humana?


                  David João Filipe
música: Revolution - The Beatles
reflexo de turma 12º 12 às 23:19

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Sexta-feira, 12 de Outubro de 2007

...

»Esta gente cujo rosto
Às vezes luminoso
E outras vezes tosco

Ora me lembra escravos
Ora me lembra reis

Faz renascer meu gosto
De luta e de combate
Contra o abutre e a cobra
O porco e o milhafre

Pois a gente que tem
O rosto desenhado
Por paciência e fome
É a gente em quem
Um país ocupado
Escreve o seu nome

E em frente desta gente
Ignorada e pisada
Como a pedra do chão
E mais do que a pedra
Humilhada e calcada

Meu canto se renova

E recomeço a busca
De um país liberto
De uma vida limpa
De um tempo justo»

«Esta Gente», Sophia de Mello Breyner Andresen, in «Geografia», 1967

 

Só porque me apeteceu...

 

a prof

reflexo de turma 12º 12 às 23:47

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Sexta-feira, 5 de Outubro de 2007

Requinte

 

 

por que é que gosto de estar sozinho?
 
nestes momentos gosto de respirar fundo na tentativa de aliviar a ansiedade que esta pergunta que provoca. sinto que não tenho de responder. de perguntas os pensadores vivem, mas costumo-os deixar morrer a perguntar e sem resposta. por é que muitos acham que eu tenho de, potencialmente, lhes estar a dever qualquer coisa que seja. não sinto que tenha de dar satisfações acerca do meu modo de vida a ninguém. não gosto de te prestar satisfações. não só não gosto como nunca o procurei fazer, a ti. não fazes parte deste canto. se te sentares solitariamente não te vou dizer que é o melhor que fazes. não te devo palavra. não te devo gestos. não te devo tempo. quando fazem algo fazem-no desinteressadamente. deliberadamente. assim sendo, fico automaticamente nada te devendo. só exijo estar sozinho. implicando, então, que a minha solidão te seja exposta. mas...sempre mas...eu não te disse nada porque tu, tão susceptivelmente, supuseste e choraste tudo e mais alguma coisa.
deixas os teus nervos darem nó porque deliberadamente pensas em mim como o problema filosófico, da tua paranóia e da tua ridícula necessidade de atenção. e eu, impávido, palavra que me deito tranquilo, sigo para a vida que quero.
olha, arranja vida. se tivesse tempo para as tuas questões e problemas existênciais e suicidas estaria definhado pela hora que vem. so me quero deitado ou encostado na luz que procuro, sozinho e vivo e atarefado com a minha existência. e tu, atarefado com a minha existência, deixas-me, d'hoje em dia, tão indeferente. dizer-te isto, seria em primeiro lugar um acto de saturação e ultimato e tornar-te-ia  decerto numa criatura tão rastejante quase acabada que não largaria a gosma brilhante da vergonha, um coisa meia desfeita. trataria a tua persistência, nos teus "meios" e "quases", tão escarninho que meteria nojo à indiferença. apetece-me ser cruel num quadro pintando algo tétrico e tortuoso. poderia ser o teu quotidiano e chama-lo-ia de obsessão.
em repetidas situações levaste a tua doença a outras almas, coitadas, e não exorcisaste as tuas manias. nem consigo ter pena. não sinto por ti. caminho sem ti.
não me persigas, não me interrogues. conseguiste tu, asquerosamente susceptível, pressentir isto e muito mais. não foi uma pergunta. sendo tão repetitivo, tornas-te numa coisa. previsível aos outros. têm-me dito isso de ti. imagina só o que não lhes cheguei a dizer...
consegui olhar, no passado.
ele perguntou-me se te teria conseguido sentir. a tua presença e o resto. mas nem destapei a ponta do véu. bastando isso...
até agora, tão longe, eu: sereno e irrascível; tu: masoquista e narcisista.
e perdoo-te. está perdoado. psicologicamente falando.
há remendo ou tratamento para muito na vida. imploras-me por ajuda. que ajuda podes tu necessitar de mim. o que pode ter a minha pessoa feito contra ti, nada, já o afirmei. auto-sugestão parece ser uma constante em ti.
caminhas atrás de mim.
rastejas ruidosamente, detrás.
o que podes tu ter feito contra ti, retratei num quadro macabro. fizeste nos traços distorcidos, amarelados, o maior crime que alguém pode cometer. auto-comiseração.
sozinho...
apenas sem ti.
fazendo de ti livre, não é sozinho que gosto de estar. apenas estou melhor sem ti.

 

 

 

Gonçalo Julião.                                                                               05/10/07.

reflexo de turma 12º 12 às 23:24

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Quinta-feira, 4 de Outubro de 2007

Dois Amigos

                                                           Dois Amigos
 

[Dizem que a vida é um livro. Se calhar. E que temos capítulos da nossa vida. Provavelmente. Às vezes achamos que um encontra-se encerrado, apenas para nos surpreendermos ao abrirmos uma página ao acaso. Há certos capítulos que, curiosamente, talvez nunca se encerrem por completo. Esta é a história de um deles. Acerca de dois amigos.]

 

Estivemos ontem no jardim. Sozinhos, debaixo da grande árvore de fruto, como estivéramos assim já tantas vezes, e como nessas vezes, ele parecia estar lá mais devido a uma obrigação do que por vontade espontânea e sua. Sim, ele foi como é sempre: estático e ao mesmo tempo transbordando de vida, como alguém que não conhece a tristeza mas que não escapa também ao sofrimento.

Como costume, era eu que lhe falava de algo e as nossas discussões acabavam invariavelmente no mesmo assunto. A nossa relação. A nossa amizade e mais.

-Mas porquê? É isso que não entendo. Tratas-me, sei lá, como a um fardo, um empecilho. Nunca esperas por mim, nunca acompanhas o meu passo! Alguém que não nos acompanha o passo é porque, ou tem assuntos a tratar de máxima urgência, ou não quer a companhia da pessoa que o tenta acompanhar, neste caso eu!

            -Já pensaste – começou a retorquir-me ele da sua maneira placidamente condescendente, como se eu fosse uma criança a quem tivesse de explicar a ordem das coisas – que eu talvez, ao contrário de ti, tenha realmente uma vida e assuntos a tratar? Que possa simplesmente estar apenas com pressa? Mas afinal, porque interpretas qualquer movimento meu como um ataque à tua pessoa?

-Porque o são! São sim, não finjas! Ainda no outro dia, quando nos acompanhava aquela bela rapariga de sei-lá-onde, tu ficaste a falar com ela durante horas e horas a fio. Mais tarde, disseste-me o quanto não gostavas da rapariga mas quando eu tentei meter-lhe graça, falaste-lhe de mim como se eu fosse uma mula de carga! Quase se notava um asco ou um desprezo da tua parte, com o teu sorriso mesquinho… E é sempre uma humilhação. Porque o fazes?

-Se o faço (e isto é, se eu o realmente faço, de que estou seguro que não) é apenas sem intenção. Nem me lembro desse incidente que me falas, pois para já, se eu fiquei horas a fio a falar com uma rapariga de quem não gostava, era apenas porque necessitava de lhe falar e ela, se existe, foi certamente a primeira a saber que eu não gostava dela. É puramente um acidente, se eu te referi de forma pouco lisonjeadora. Tu é que o interpretas como humilhação. Tu é que, na mais pura das verdades, te humilhas a ti próprio.

Calei-me para meditar. O regato corria primaverilmente, como sempre, escapando ao seu tempo. Sentia já no ar o aroma a Inverno, com as suas tempestades. Mas era esta a estação que eu mais adorava, porque mais tempo passava eu com ele, e mais próximos ficávamos. Quando chegávamos a casa, molhados da chuva e nos secávamos aconchegados um ao outro, isso era o nosso Inverno. Mas ele acabava por arruinar tudo sempre com alguma frase vingativa, não que eu lhe tivesse feito necessariamente algum mal ou que fosse mesmo uma vingança da parte dele. Era verdade a sua boa intenção e magoava-me por dizer a verdade. As verdades de quem amamos são sempre mais difíceis de ouvir que as mentiras de um desconhecido. É por isso que sempre me descontentou ele nunca se incomodar com as minhas verdades.

-Não. Não pode ser – comecei eu – essa explicação não me satisfaz!

-Que outra explicação queres? Ora, ficas ai, todo indignado porque no outro dia não te prestei atenção ou disse-te algo que não gostaste? Aquela é a verdade, que outra explicação queres que eu te dê? Se ficaste decepcionado pela minha resposta, é porque esperavas demasiado. É esse o teu problema. És um romântico incorrigível. Ou esperavas um discurso asquerosamente comovente, ou algo de uma gargantuesca crueldade contra a qual tu te pudesses revoltar! Se não estás satisfeito, a culpa é tua, não minha!

-Vês? Mas porque és assim tão frio comigo? É como se renegasses as coisas que já me disseste.

-As coisas que eu já te disse já te as disse. Agora digo isto. És impossível de contentar. Agarraste demasiado ás coisas e procuras significado em tudo. Apenas irás sofrer quando descobrires que as coisas não têm significado. Irás ficar aliviado quando aperceberes isso acerca das coisas más que te faço, mas também irás sofrer ao aperceberes-te que, se sou um dia bom para ti… bem, não tem nenhum significado especial e nada tem a haver contigo. É apenas mais um dia.

-É disso que eu falo! Afastas-me, dizes-me as coisas mais cruéis! E depois censuras-me por ficar tão chocado. Já tantas vezes o tentei não ficar e dar a outra face, mas é impossível ignorar-te, sabes bem. És responsável por tanto na minha vida e por tanto daquilo que eu sou e tu não assumes a merda da tua responsabilidade.

-Elá, tento na linguagem! Tem calma! Eu não sou responsável de nada! Eu nunca te pedi nada e se vives como vives é de certo por tua culpa. Se tive alguma influência na tua vida, sim, e há dias às vezes em que me dera que não me conhecesses, a sério! Nunca me arrependi de ti mas magoa-me o quanto tu sofres por mim. Porém és tu que sofres por mim, não sou eu que te faço sofrer, por isso tento na linguagem e nesse assunto das responsabilidades.

Chateei-o. Acho. Será que eu sou importante o suficiente para ele ficar magoado comigo? Talvez. Ele diz sempre que não gosta do que me fez. Que se pudesse desapareceria da minha vida, sem passado, presente ou futuro para que eu continuasse na minha ignorante felicidade. Mas seria ignorante, e eu não sei ao certo se, agora que sinto aquilo que sinto e que me faz sofrer tanto, apesar de ser igualmente a única coisa porque eu vivo, dia após dia… se eu realmente quereria isso. Se ele desaparecesse da minha vida… Talvez fosse o melhor para ambos, mas eu sei que murcharia por dentro.

-Tu sabes que eu te amo. Dizes sempre que as pessoas que tu amas têm a consciência que são amadas por ti. Eu não a tenho. Não me amas?

Ele contemplou o jardim. Pensaria em quê? No quanto me amava, ou como me dizer simpaticamente que apenas sentia indiferença por mim?

-Não. – Dei comigo a falar sozinho. – Sei que não sentes indiferença por mim. Simpatizas comigo até certo ponto. Sei que já gostaste de mim. Que já sentiste carinho por mim e já mo disseste e que também me disseste que querias emendar todo o mal que me tivesses feito. E que sofro de um terrível complexo de inferioridade pela tua pessoa. Mas nunca chegaste a emendar nada. Continuas quem eras. Frio. Nunca me falas sem eu te falar primeiro. Nunca vens ter comigo. Nunca me pedes ajuda e fazes-me sempre sentir como se eu fosse um pedinte de atenção. Chego a ter nojo de mim próprio pela forma doentia de como necessito de ti. Mas desde que te conheço, que eu sei quem eu sou. Já pensei saber quem tu eras. Até tu me teres dito o contrário. E eu fiquei sem saber no que acreditar.

Houve quem me dissesse – continuei – amigos meus… que não me queriam ao pé de ti. Não me queriam como teu amigo. Porque tu me fazes mal. E é uma verdade. Eles dizem que seria melhor separarmo-nos e irmos caminhos diferentes. Mas sempre me pareceu que vivia sem saber o segredo que toda a gente parece saber acerca da vida. Até me sentiria mal, se eu não tivesse tanto a certeza que apenas fingem saber o segredo. Talvez o segredo até fosse fingir saber um segredo. Mas junto a ti, descobri-me. Sinto-me seguro e sei quem sou. A escolha é tua. Preciso que me digas se queres que eu fique contigo ou não. Preciso de saber…

A grande árvore de fruto sobre nós deixava escapar flores brancas, e antes que déssemos por isso, era como se houvesse nevado e estávamos repletos de pequenas pétalas maravilhosas de amendoeira, que apenas contribuíam ainda mais para a beleza dele. Os seus traços suaves, da sua longa e serena face. Os olhos pálidos, do cinzento das estátuas gregas de um Apolo rei. O cabelo longo, pendente até aos ombros, loiros e rubros como o Sol de todas as cores da aurora e amanhecer. Nenhum escultor te teria feito melhor, do que tu ainda és na minha mente.

-Amas-me?
 
 

Cai uma pétala.

Corre o ribeiro.

Tu suspiras.

E finalmente falaste.

-Porque me buscas a atenção? Todos os dias arranjas um estratagema de me obrigares a demonstrar-te carinho e afecto. Há dias em que eu faço exactamente o contrário para tu te aperceberes que não deves buscar a minha atenção. Eu nunca fui pessoa que dê muita atenção ás outras. Tu ficas magoado quando eu não fico triste por tu te ires embora, tu ficas magoado por eu não necessitar de ti tanto quanto tu necessitas de mim, ficas magoado por eu não me prender e tu encontraste preso por algo que tu próprio criaste. Tens inveja de pessoas que já não cá estão connosco, porque em tempos foram-me mais importante do que tu eras. Eu não necessito de ninguém. E sempre deixei isso bem claro. Eu avisei-te, desde que nos conhecemos, que não procurasses em mim … esse amor. Falas dos teus amigos, mas os teus amigos são ignorantes e preconceituosos, claro que eles não querem que sejas meu amigo. Mas eu sou teu amigo. Profundamente. Eles acham que fui eu quem te corrompi, mas eu não te fiz nada. Só te deixei fazer o que querias fazer. Até eu me ter aborrecido. Eu amo-te, sim… Mas não te posso dar amor.

-Então é verdade. Todos os dias, escondo o meu amor do mundo, escondo-o dos meus amigos e da minha mulher. Por medo de me reprimirem outra vez, de me repreenderem como fazem a uma criança que não aprende. Toda a gente me trata como uma criança, pensei que talvez tu não o fizesses. Mas acabaste-lhes de dar razão. Eu nunca aprendo.

-Todos te tratam assim porque é assim que tu te apresentas a todos. Eles vêm em ti uma criança porque tu queres que eles vejam uma criança. Eu não sei quem tu és. Procuras-te sempre em mim respostas que nem eu tenho acerca da minha própria pessoa, quanto mais a tua. Mas nunca te vi como uma criança.

-Já me odiaste.

-Já.

-Já me ignoraste.

-Já.
-E agora amas-me.

-Como a um belo amigo. Nada mais, e nada menos.

-Mesmo assim, são só palavras. As tuas acções irão magoar-me eternamente… Mas talvez os bons amigos se magoem eternamente também…


 

David João Filipe

 
música: Chopin - Nocturne in Cminor for piano
reflexo de turma 12º 12 às 14:17

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Quarta-feira, 3 de Outubro de 2007

Pensar vs. Viver

escrevi este texto num contexto, na altura, muito especial. fazia parte duma cultura pouco explorada, numa sociedade literária chamada jornal...

sei bem pensar nas palavras que redigi, que não sei se voltaria a redigir, uma vez tão desprovidas de perversão mas ditas com alguma sapiência.

sabendo eu o que era na altura, do que pensava na altura, constato que antes e depois de publicar esta composição me foram dados sorrisos, que não compreendia, por altas entidades.

talvez tenha sido o primeiro ser a estampar um "etc" numa composição poética...mas nem tão pouco ligara à formalidade do texto, respeitando apenas o princípio que queria expôr. mas lembro-me perfeitamente de o redigir, lembrando-me, ou melhor, não me lembrando da razão pela qual o redigi.

reparando que na altura já teria uma noção/visão metafísica ou cármica da Vida.

usando também metáforas para a concordância entre a Vida e o seu impacto no Mundo. explorando a morte; a extinção, a troca; a existência e os seus desígnios.

avalio também questões de pertença, que agora repito para dentro, em interrogação, impestado pela vivência que me corrompeu aquela simplicidade de ver a Vida como algo maleável e perfeitamente ajustável ou sugestível, a qual podemos ditar como deveras a queremos.

concluindo com uma tese metafórica a qual não consegui decifrar por completo.

pois que me tornou a Vida diferente, sei o que sabia e sei o que sei e assim continua. pois que é difícil, a Vida.

e agora? já a pensei, duas vezes, de diferente mente. Vivê-la, será um bom projecto, querendo um pensar, não um grande pesar.

será realizável um tratado de paz entre reflexão e Vida? muitos, mais não fizeram que pensar a Vida, e morreram atormentados...passo essa parte.

Vivo, mas penso...

quero ser um ácaro.

goncalus somethin' now...             30/09/07

para ver no contexto: http://absolutesinner.blogs.sapo.pt

música: Hail Tyranny- Anorexia Nervosa
reflexo de turma 12º 12 às 16:17

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